quarta-feira, 1 de maio de 2013

Abril



- Um homem de partes, David Lodge (3,5)
- La guerra contra el cliché, Martin Amis (4,5)
- A praia dos afogados, Domingo Villar (4+)

[Notas de 0 a 5]


Alguém descreveu H.G.Welles como 'o homem que escreveu 100 livros e dormiu com 100 mulheres' - e não está longe da verdade.

Orwell, antes de o atacar ferozmente,  descreveu-o como o homem mais influente de Inglaterra no inicio do século XX  e o 'amigo' Henry James escrevia-lhe cartas pretensamente elogiosas, onde aproveitava para dar uma série de alfinetadas aos seus livros e se queixar do sucesso que Welles tinha e que um escritor sério - como o próprio James, por suposto -  nunca poderia ter.

Welles partilhou a sociedade dos Fabianos com Bernard Shaw e outas personagens ilustres da 'esquerda' inglesa, mas nunca se entenderam completamente, em parte devido à sua propensão para se envolver com as filhas adolescentes dos membros da sociedade. Casado durante muitos anos com a mesma mulher, advogava o amor livre e teve muitas amantes com o conhecimento daquela, e inclusive filhos de duas delas acabadas de sair da adolescência. O escândalo do primeiro caso foi tão grande que teve que esconder até tarde o segundo filho ilegítimo, uma das raríssimas ocasiões em que não fez às claras o que muito bem lhe apetecia, atitude que lhe granjeou inúmeros ódios ao longo da vida.

Hoje só nos lembramos de meia dúzia dos seus livros, especialmente os de ficção científica do inicio da carreira ('A Guerra dos mundos'  ou 'A máquina do tempo'), e os livros com que pretendeu mudar o mundo, como socialista (altamente idiossincrático) que era, estão votados ao esquecimento. O seu sonho de um governo universal não se concretizou, embora ainda tenha tido um papel na criação da actual ONU, mas muitas das suas previsões concretizaram-se arrepiantemente, como os bombardeamentos massivos como táctica de guerra (que ele previu para a 1ª guerra mundial e que para seu horror se tornaram uma realidade na 2ª) ou a invenção da bomba atómica quando ainda mal se falava na fissão do átomo.

Os seus sucessos como influentíssimo homem público e como escritor de best sellers podem ser considerados espectaculares para um homem que nasceu na classe mais baixa da altamente estratificada sociedade inglesa da época, e que chegou ao topo graças à sua enorme inteligência e capacidade de trabalho. Quando uma vez a mulher nota surpreendida como ele se move com um à vontade completo na mansão senhorial de uns amigos ricos das classes altas, com todos os protocolos e etiqueta inerentes à situação, ele responde-lhe simplesmente que desde miúdo que conhece perfeitamente esse mundo... por o ver do lado dos criados (era a profissão da mãe). E o seu sucesso como amante inveterado de mulheres não é menos espectacular, tendo em conta que tinha apenas um metro e meio e tendência para engordar.

Ou seja, esta é uma vida que estava mesmo à espera de ser contada, e David Lodge fá-lo com competência - embora sem deslumbrar. Lodge já tinha tentado a biografia ficcionada com Henry James, em 'Autor, autor' (que conto ler em breve), mas teve o azar de na mesma altura ter saído o muito bom 'O mestre' de Colm Toíbin sobre o mesmíssimo tema, e que o eclipsou quase completamente. Voltou a tentar com Welles e fez bem.

De resto li o clássico de Amis em espanhol (não perguntem) e um estupendo policial galego. Um bom mês.

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